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Prosa Pantaneira: confira as respostas dos especialistas para as principais perguntas da Live sobre as queimadas no Pantanal

Publicado em: 26/03/2021

A Live Prosa Pantaneira trouxe especialistas diretamente envolvidos nos estudos do território e nas ações de monitoramento, prevenção, combate às chamas e restauração das áreas afetadas pelas queimadas no Pantanal em 2020.

Com o intuito de mostrar a real situação do Pantanal, desmentir as Fake News e esclarecer as dúvidas do público, a Synergia convidou:

Diego Arruda, veterinário e comunicador, responsável pelo departamento de marketing do SOS Pantanal.

Felipe Dias, engenheiro agrônomo com mestrado e doutorado em geografia física. Atua como diretor executivo do SOS Pantanal desde 2015.

Márcio Yule, coordenador estadual do Ibama/PrevFogo em Mato Grosso do Sul.

Renata Libonati, graduada em Meteorologia e doutora em Sensoriamento Remoto, ambas pela Universidade de Lisboa (Portugal). Atualmente, é professora do dep. de meteorologia da UFRJ. Trabalha com pesquisas focadas na produção de dados de área queimada para o Pantanal.

Além de uma das reportagens mais completas sobre os incêndios no Pantanal, a Live rendeu muita informação nova e de qualidade, tanto sobre as ações já implementadas quanto sobre as que serão aplicadas, possibilitadas principalmente por esforços de arrecadação de verbas emergenciais, como a Campanha Synergia em Defesa do Pantanal.

A participação do público, que expôs as suas principais dúvidas, garantiu uma intensa troca de informações e muitas perguntas para os especialistas.

Perdeu o encontro Prosa Pantaneira? Confira a Live completa!

Perguntas e respostas sobre as queimadas no Pantanal

Algumas questões sobre as queimadas no Pantanal ficaram para a resposta posterior dos nossos convidados e convidada. Confira abaixo!

Pergunta 1 – O que significa inundação negativa? Como medir abaixo do “zero”?

Felipe Dias: Por meio do que chamamos de régua, instalada em um local próximo da margem, começaram as medições, em 1900. Quando o volume de água fica abaixo do local onde a régua foi instalada, a medição passa a ser negativa.

 

Pergunta 2 – Como reverter as ações humanas propositais, vocês sabem quais são as causas?

Renata Libonati: Quando falamos em incêndios florestais é importante entender por que eles ocorrem. Para isso, devemos lembrar do conceito de triângulo do fogo. Para se iniciar um incêndio florestal, é preciso a atuação simultânea destes três atores: atmosfera quente e seca (clima), material combustível (vegetação) e ignição (ação humana). A meteorologia não podemos controlar, mas podemos prever; A vegetação podemos controlar através do correto manejo na paisagem, diminuindo a biomassa disponível; A ignição humana podemos gerir de duas formas – através de fiscalização e punição (com efeitos de curto prazo), e através da conscientização e educação (com efeitos de longo prazo).

Na época seca, praticamente todos os incêndios florestais são causados pela atividade humana. Podem ocorrer devido a acidentes – desde os causados por faíscas de acidentes automobilísticos, rompimento de redes elétricas, balões que caem na mata – e por causas criminosas, intencionalmente para devastar a vegetação, contando com a impunidade.

Na Amazônia, a causa principal do fogo é o desmatamento, pois após cortar as árvores, os troncos são empilhados, deixados para secar e, por fim, incendiados. Em algumas regiões, o fogo é usado intencionalmente para queima de pastagem, de resíduos e caça. Porém, nesses casos, quando não se tomam as medidas de precaução, o fogo escapa do controle e gera grandes incêndios.

 

Pergunta 3 – Vimos um atraso nas respostas do governo para medidas emergenciais e uma redução no combate ao fogo e às queimadas no Pantanal. Isso é real? Quais medidas deveriam ter sido tomadas?

Márcio Yule: Desde março (2020), o IBAMA vinha realizando operações de combate aos incêndios, utilizando brigadistas contratados em anos anteriores. O Programa Federal de Brigadas permite contratar um contingente definido para cada Estado pelo período de seis meses. Em 2020, o período dessa contratação foi de julho a dezembro. Nos combates realizados em março e abril, os brigadistas foram contratados como colaboradores eventuais.

Também, graças à parceria com a FUNAI, pudemos realizar a contratação de brigadistas que, em conjunto com a comunidade indígena, realizaram ações na Terra Indígena (TI) Kadiwéus, favorecendo para que pudéssemos reduzir em 30% a área queimada naquela TI.

Além do aporte de combatentes do IBAMA/PREVFOGO, as brigadas do ICMBio receberam apoio de brigadas de outros Estados, combatentes do Corpo de Bombeiros do PR, DF e SC, além do contingente da Força Nacional de combate aos incêndios florestais.

 

Pergunta 4 – Sobre áreas que nunca passaram por queimadas no pantanal, quais as implicações em termos de recuperação de espécies e retorno das condições do ambiente?

 

“Verificamos que aproximadamente 40%

da área que queimou em 2020

nunca havia queimado nos últimos 20 anos.

Serão necessárias análises profundas,

ainda em andamento,

das consequências deste evento.”

Renata Libonati

 

Felipe Dias: Acredito que, em algum momento, todas as áreas já tiveram incêndios. Onde os focos aconteceram com maior intensidade, a recuperação de algumas espécies resilientes ocorre naturalmente. Contudo, voltar ao que era originalmente é muito difícil.

Renata Libonati: Através do monitoramento do LASA (Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais do Departamento de Meteorologia da UFRJ), verificamos que aproximadamente 40% da área que queimou em 2020 nunca havia queimado nos últimos 20 anos. Desta forma, serão necessárias análises profundas, ainda em andamento, das consequências deste evento.

Participantes da Live Prosa Pantaneira discutem queimadas
Participantes da Live Prosa Pantaneira discutem queimadas no Pantanal e medidas para evitar futuros incêndios na região.

Pergunta 5 – Quando se trata de resiliência climática e adaptação a eventos extremos, vocês conseguem prever os impactos e determinar as medidas de gestão de risco a esses desastres?

Felipe Dias: Compreendo que existem modelos de cenários, construídos a partir de parâmetros climáticos, que podem auxiliar na tomada de decisão para evitar e/ou mitigar os riscos.

Renata Libonati: Observamos nas últimas décadas, um aumento na frequência, duração e intensidade de eventos extremos, como secas e ondas de calor, relacionado com a elevação da temperatura média global, em decorrência do aumento das emissões de gases do efeito estufa. Os incêndios estão atrelados a esses eventos extremos. Podemos citar fogos na Austrália, Califórnia, Portugal e no Pantanal. Dadas as projeções de continuação de tendências de aumento de temperatura e diminuição de chuva em determinadas regiões, podemos esperar que os incêndios devastadores serão também mais frequentes.

 

Pergunta 6 – Quem quiser mais informações em treinamento para brigadistas de florestas, onde conseguir material e cursos?

Márcio Yule: Em 2020, durante as operações de combate, realizamos a capacitação de militares e moradores ribeirinhos.

Para 2021, em parceria com a SOS Pantanal e o IPE – Instituto de Pesquisa Ecológica, estamos prevendo capacitar um contingente de aproximadamente 100 pessoas, formando brigadas em locais estrategicamente definidos.

A Coordenação do Prevfogo de Mato Grosso do Sul vem buscando incentivar que interessados se estabeleçam em grupos, associações e instituições organizadas, de modo que possamos preparar e implementar instrumentos de prevenção e ações efetivas de combate aos incêndios florestais nas suas respectivas áreas de atuação.

 

Pergunta 7 – Poderiam explicar a importância do serviço ambiental que essas áreas alagadas (Wetlands) realizam para a conservação das águas?

Felipe Dias: O Pantanal é uma planície alagável, e nas regiões onde o alagamento é maior, a absorção e armazenamento de carbono é grande. A planície pantaneira é uma formação vegetal bastante rica e conservada e, neste aspecto, os serviços ambientais são muito relevantes.

Existem estudos avaliando o que estes serviços geram economicamente. Mas acredito que o Pantanal seja um regulador da temperatura no continente, considerando que a água é um elemento que demora de 3 a 5 vezes mais tempo para aquecer, ou resfriar, do que outras superfícies.

 

Pergunta 8 – Qual é o status das pessoas que foram atingidas pelas queimadas no Pantanal?

 

“Os danos ambientais atingiram toda a sociedade,

e o reflexo do excesso de fumaça e

fuligem desses incêndios florestais

puderam ser sentidos até mesmo na cidade de São Paulo,

com o que ficou conhecido como ‘chuva negra’.”

Márcio Yule

Márcio Yule: Os danos ambientais atingiram toda a sociedade, e o reflexo do excesso de fumaça e fuligem desses incêndios florestais puderam ser sentidos até mesmo na cidade de São Paulo, com o que ficou conhecido na mídia nacional como “chuva negra”.

Porém, os mais necessitados e os moradores locais, que retiram seu sustento da natureza, foram os mais atingidos e tiveram sua vulnerabilidade aumentada.

Com a seca e os incêndios florestais, a população ribeirinha teve uma perda enorme de qualidade de vida, trazendo problemas respiratórios, diminuição da fonte de renda e falta de água potável. Entre os prejuízos econômicos estão a perda momentânea de visitações turísticas e de patrimônio, de implementos agrícolas e de rebanhos de gado.

 

Pergunta 9 – Quais são as sanções para quem faz o uso de fogo sem autorização do órgão ambiental?

Márcio Yule: Temos na legislação brasileira um conjunto de sanções para cada tipo de ilícitos ambientais: Administrativas, Civis e Penais.

Caso um proprietário use o fogo sem a autorização do Órgão competente (no caso de MS, o IMASUL), ele será autuado em R$1.000,00 por hectare.

Se o incêndio florestal atingir matas ou florestas, o proprietário poderá ser multado em até R$7.500,00 por hectare, dependendo se nessa mata encontrarmos espécies florestais ameaçadas de extinção.

Se o incêndio florestal causar prejuízo para outras pessoas, esse causador terá por obrigação, definida por um juiz, a reparação e indenização dos danos e prejuízos.

Se causar incêndio florestal em mata ou floresta, o agente causador poderá sofrer sanção penal de dois a quatro anos de reclusão, também definida por um juiz.

 

Pergunta 10 – Segundo a Lei de Acesso à Informação, o número de fiscais do Ibama sofreu uma redução de 55%, de 2010 a 2019, e 47% em 2020. O aumento das queimadas no último ano pode ser consequência do enfraquecimento dos órgãos de controle?

Márcio Yule: A competência para regular o uso do fogo, licenciar e fiscalizar é dos Governos Estaduais, desde que a publicação da Lei Complementar 140/2011 definiu as competências entre a União, os Estados e os Municípios na gestão ambiental.

 

Como podemos verificar nas taxas de desmatamento anual da Amazônia Legal (PRODES), publicadas pelo INPE, há uma tendência de redução de área desmatada entre 2004 e 2014.

A falta de fiscalização mais efetiva e permanente é, atualmente, o maior incentivador para ações ilegais de desmatamento, garimpos e causadores de incêndios florestais.

Taxas de desmatamento anual da Amazônia Legal (PRODES) 

Pergunta 11 – Como distinguir os incêndios criminosos e os controlados, analisando os dados do INPE?

Márcio Yule: A queima controlada, autorizada pelos órgãos competentes, possui a sua localização geográfica, que pode ser confrontada pelas diferentes instituições de controle e fiscalização. Normalmente, é uma atividade que ocorre num espaço de tempo menor do que 12 horas. O mesmo ocorre com as queimas prescritas, que se distinguem das queimas controladas por não terem o fator de produção como principal objetivo.

O incêndio florestal, por ser o fogo sem controle, pode perdurar por dias, atingindo, portanto, uma área maior.


Pergunta 12 – Se é possível realizar queimadas, tendo autorização, isso não seria apenas acabar com o bioma legalmente? É correto queimar essas florestas?

Márcio Yule: O uso do fogo na forma de queimas controladas pode ter impactos negativos. Porém, bem menores do que os causados pelos incêndios florestais sem nenhum tipo de controle prévio.

Em algumas comunidades tradicionais, o uso do fogo faz parte da economia, cultura e tradição local. Se esse fogo é utilizado com práticas corretas e seguras, podem evitar incêndios maiores e garantir a segurança da comunidade.

Em ecossistemas como o Cerrado e o Pantanal, o fogo pode ter um papel ecológico importante, estimulando a floração, a frutificação e a germinação das sementes.

O uso do fogo, através das queimas prescritas, também pode ser feito nos meses que antecedem o período crítico, para reduzir o combustível (vegetação) para os incêndios florestais. Nesse caso, o IBAMA incentiva e constrói, junto com as comunidades locais, instrumentos que usam o fogo como ferramenta de gestão através das queimas prescritas.

*Algumas perguntas e respostas foram editadas por questões de tamanho.

 

O momento atual do Pantanal é de recuperação, mas não podemos esquecer que as queimadas na área são frequentes e que, se não forem controladas, podem se espalhar rapidamente. Por isso, é tão importante continuar ajudando as organizações que atuam na área, preservando o território e agindo para que não ocorram novas tragédias ambientais, como a que foi vista em 2020.

Visite o site do SOS Pantanal, confira alguns dos resultados da campanha Synergia Em Defesa do Pantanal e saiba como continuar ajudando.

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15 – Vida terrestre

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