Artigo

Licenciamento, Educação Ambiental não formal e o papel das empresas

Publicado em: 09/12/2021

A responsabilidade social sobre a crise ambiental vem crescendo nas últimas décadas, o que inclui necessariamente novas posturas no nível individual e coletivo; no âmbito governamental, das empresas e da sociedade civil organizada.

Além disso, também do ponto de vista jurídico, algumas leis e instrumentos foram regulamentados visando minimizar, mitigar ou até mesmo resolver problemas que, fruto do desenvolvimento econômico desenfreado, levam a danos sociais e ambientais.

No Brasil, “o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado” está assegurado pela Constituição (artigo 225). Dessa forma, cabe ao Poder Público promover ações, tais como a exigência de estudos ambientais prévios à instalação de obras ou atividades com potenciais danos ao meio ambiente (EIA) e onde aparece a Educação Ambiental (EA) alinhada à conscientização de preservação ambiental.

Assim, a construção, instalação ou operação de empreendimentos potencialmente degradadores do meio ambiente só podem ser executadas a partir de um processo de licenciamento que garanta a minimização de possíveis danos.

Esse licenciamento passa por uma série de condicionantes, incluindo propostas de diminuição/mitigação de impactos e compensação ambiental que o empreendedor deve submeter à aprovação do órgão ambiental.

A EA é considerada pela legislação brasileira (Lei no. 9.795) como “instrumento indispensável para o desenvolvimento integrado em uma sociedade sustentável”. No contexto de cenários em que haja ambientes impactados por instalação/operação de grandes empreendimentos, a EA constitui “uma ferramenta para fortalecimento da cidadania em prol da preservação e recuperação do meio ambiente e da melhoria da qualidade de vida das comunidades afetadas ou envolvidas”.

Especificamente, nos processos de licenciamento – nas etapas de Licença de Instalação (LI) e de Licença de Operação (LO) – o papel da EA é imprescindível para impulsionar a cidadania participativa, por meio dos Programas de Educação Ambiental, sejam eles voltados para o público interno ou externo.

Licenciamento e Educação Ambiental caminham juntos

A década de 1990 foi bastante importante para a inserção da Educação Ambiental nos processos de licenciamento.

Com a criação do Programa Nacional de Educação Ambiental (PRONEA), em 1994, ela passou a ser vista como peça-chave na “gestão ambiental pública”, ainda que só tenha entrado em vigor em 2005 ao refletir sobre o papel da Educação Ambiental no processo de empoderamento de grupos sociais.

Nesse contexto, a EA foi dividida em duas frentes, “formal” e “não formal”, cabendo ao IBAMA a responsabilidade de definir as diretrizes da última.

Retomando o contexto do licenciamento, o artigo 3 da lei supracitada institui a promoção da EA pelas empresas públicas ou privadas, destinadas a viabilizar programas, voltados para a capacitação de trabalhadores e trabalhadoras, visando melhoria e controle no ambiente de trabalho, e repercussões do processo produtivo ao meio ambiente e, também, à comunidade envolvida (BRASIL, 1999, p.1-2).

A partir dessa argumentação, observa-se a importância da promoção da EA nas empresas, como forma de despertar, junto a seus colaboradores e colaboradoras e todos/as aqueles/as que a cercam, ações educativas que busquem a sensibilização sobre suas responsabilidades em relação ao meio ambiente.

Licenciamento, Educação Ambiental não formal e o papel das empresas
Licenciamento, Educação Ambiental não formal e o papel das empresas. Foto: Fórum de Sustentabilidade

A Educação Ambiental passa, então, a ser “uma política pública” que se traduz em “Educação para a gestão ambiental”, promovendo desenvolvimento de habilidades, conhecimentos e atitudes, tanto individuais quanto coletivas, que sejam significativas “na gestão do uso de recursos naturais”.

O licenciamento ambiental torna-se, portanto, um instrumento de gestão ambiental do Estado, incluindo todas as suas etapas: estudos, programas e audiências públicas – espaços nos quais espera-se a participação cidadã.

Quando um órgão ambiental decide pelo licenciamento ou não de um empreendimento, ele está tomando partido e definindo quem ganha ou perde com tal ação. No ambiente empresarial, cabe às organizações desenvolverem ações em permanente processo educativo e investir em processos de educação ambiental.

A Educação Ambiental, nesse contexto, deveria estimular a criação de ambientes de aprendizagens e oferecer condições para que, não apenas colaboradores e colaboradoras dessas empresas, mas também as comunidades do entorno, desenvolvam competências para criar alternativas inovadoras visando o uso sustentável do meio ambiente (ADAMS, 2005 apud XAVIER e cols: 2012, p. 16)1.

A inserção da EA nas empresas visando a construção da sustentabilidade culmina com o treinamento de funcionários/as, proporcionando sensibilização ambiental e competência profissional, constituindo-se em prática educativa e de gestão abrangente.

Essas práticas permearão tanto a participação da sociedade nas discussões sobre as questões ambientais, quanto as mudanças de atitudes e valores para a transformação da realidade de degradação ambiental (JARDIM, 2009 apud XAVIER e cols: 2012, p. 17-18).

No entanto, como se sabe, lei é lei. E cumpri-la não necessariamente significa promover processos de convocação para tomada de consciência, nem mesmo a criação de espaços para promover a participação e o diálogo.

Por parte das empresas, muitas vezes não existe abertura, e nem mesmo interesse, em aprofundar nos processos educativos, uma vez que há temor ou receio de serem criticadas, questionadas ou demandadas pelas comunidades.

Nesse contexto, a Educação Ambiental se torna mera sensibilização superficial centrada em eventos pontuais, sem continuidade, e cuja escolha de temáticas abordadas concentram-se muito mais nos temas globais (aquecimento global, falta d´água e reciclagem) do que em abordagens sobre os problemas locais, evitando-se o conflito ambiental vivido.

Além disso, na promoção de debate sobre o enfrentamento dos problemas, a solução geralmente recai na responsabilidade individual. Isso gera uma ilusão sobre a autonomia das pessoas em relação à transformação social, evitando enfrentar uma educação voltada a desenvolver valores e capacidades para torná-las aptas a tomar decisões frente aos impasses gerados pelo modelo de produção vigente.

Loureiro (2009, p.6) afirma que há desarticulação entre os programas de educação ambiental no contexto de licenciamento com a realidade das comunidades envolvidas no processo de transformação ambiental, social, cultural e histórica causadas pela instalação do empreendimento licenciado.

Para o autor, existem dois argumentos que justificam isso. O primeiro seria baseado na ideia de que há a execução de cursos e eventos sem um prévio conhecimento e diagnóstico da dinâmica do território, dos conflitos e das formas de organização social existentes”.

Ele complementa, ainda, com a sua opinião sobre a grande ausência que causa a desarticulação no processo, já que “os conteúdos são estruturados sem considerar estas informações e o diálogo com quem é sujeito do processo educativo.”.

Por isso, a importância de um Diagnóstico Socioambiental Participativo para que possa adequar o Programa de Educação Ambiental à realidade da transformação gerada pelo empreendimento.

Licenciamento, Educação Ambiental não formal e o papel das empresas PEA Professores
Programa de Educação Ambiental (PEA) realizado pela Synergia com comunidade. Foto: Synergia

A EA não ocorre na etapa de licença prévia, mas apenas na etapa de instalação, quando então a participação cidadã se vê restrita nos processos decisórios já em andamento. Conforme se vê, ainda há muito para ser discutido sobre a Educação Ambiental no âmbito do licenciamento.

Ainda assim, podemos conceber a EA no Licenciamento Ambiental como um processo de mediação entre os interesses dos sujeitos que vivem no território em que se instalam as empresas e suas operações.

Esse processo de mediação define e redefine, continuamente, o modo como os diferentes sujeitos, por meio de suas práticas, alteram a qualidade do meio ambiente, e, também, como se distribuem os custos e os benefícios decorrentes da ação desses agentes.

Entendemos, por exemplo, que o enfrentamento da crise ambiental atual está inscrito na superação do modo de produção e consumo – o qual se configura como manutenção da ordem de mercado estabelecida e não como simples pauta da redução do consumo sem contextualização da produção, conforme dissemina a mídia.

Ainda assim, é possível destacar iniciativas relevantes empreendidas pelas empresas e pela sociedade para transformar ações significativas em impactos positivos para a sociedade. É nisso que precisamos focar e colocar as nossas expectativas para o futuro da Educação Ambiental.

 

*A Synergia possui um Núcleo de Educadores dedicados especialmente às temáticas de Educação Social e Ambiental, sempre atento ao desenvolvimento de novos métodos e abordagens que tragam conhecimento e aprendizagens efetivas nos nossos territórios de atuação. A equipe do Núcleo elaborou este artigo buscando esclarecer aos nossos leitores o contexto e relevância da Educação Ambiental na sociedade contemporânea.*

 

O Artigo “Licenciamento, Educação Ambiental não formal e o papel das empresas” é o segundo de uma série de 3 textos produzidos pelo Núcleo.

Confira o primeiro artigo publicado:  “Educação Ambiental e desafios contemporâneos”.

E o último artigo da série sobre Educação Social e Ambiental : As práticas pedagógicas de Educação Ambiental e o contexto político metodológico

 

8 – Trabalho decente e crescimento econômico
13 – Ação contra a mudança global do clima
17 – Parcerias e meios de implementação

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